quarta-feira, 3 de agosto de 2011

A constante mutação e os hábitos

Quando olhamos para o por do Sol não notamos o movimento da Terra em relação ao astro, e isso ocorre porque os astros e os planetas se movem de forma tão constante e uniforme que tudo parece estar parado, e quando menos percebemos o Sol já se foi. Isso acontece porque tudo muda o tempo todo, nada permanece estático.

Utilizei este exemplo para ilustrar o fato de que o universo todo está em constante mutação. Imutável é a lei de que tudo muda. Esse é o ensinamento do livro I Ching, clássico chinês antiquíssimo, o famoso livro de adivinhação e sabedoria. Para quem não se lembra, é o oráculo que se joga com três moedas que possuem um furo quadrado no meio. Confúcio estudou esse livro e diz-se que ele afirmava desejar possuir uma vida inteira só para estudá-lo. Em uma passagem de algum livro do Osho, encontra-se uma história (logo postarei ela aqui no blog) em que Buda afirma que nunca somos os mesmos, porque mudamos a cada momento. Milhões de células do nosso corpo nascem e morrem a cada instante, então apenas somos muito parecidos com alguém que viveu antes. Lao Tsé também afirma o mesmo.

Da mesma forma nossa mente muda. Conforme vivemos e experienciamos o mundo, vamos mudando a nossa maneira de pensar. Tente se lembrar de algumas coisas que você pensava ou fazia anos antes e que achava que nunca mudaria, você pode até rir um pouco. Entretanto, muitas pessoas tentam permanecer com o mesmo pensamento e comportamento durante toda a vida, querem ser sempre do mesmo jeito. Se gasta muita energia mental para se manter no mesmo padrão sempre, sem mudar. O ego se ilude achando que a pessoa permanece do mesmo jeito, mas por mais que tente, ele é incapaz de impedir que ela mude. Pelo menos um pouco o indivíduo acaba transformando algo na sua personalidade, no seu pensamento.

Mas existem pessoas que entendem que precisam mudar, e um dos maiores obstáculos que essas pessoas encontram são os hábitos. Mas o que são os hábitos? De uma forma geral, penso que hábitos são padrões de pensamento e comportamento. Por exemplo, se uma pessoa age de forma violenta não é porque ela é violenta em si, mas porque seu padrão de pensamento é violento, ou seja, ela está habituada a pensar de forma violenta. De uma forma geral, a maioria das pessoas forma a sua identidade a partir de seus hábitos. Você mesmo é a pessoa que gosta disso e desgosta daquilo, que come uma coisa e não outra, que ouve tal e tal tipo de música, etc. Isso não passa de hábitos, você apenas se habituou a acompanhar determinados tipos de coisas rejeitando outras. Veja por exemplo a alimentação: a alimentação é um hábito, você desde criança é acostumado a comer determinado tipo de comida e então quando você muda para uma cultura muito diferente acaba estranhando. Muitas pessoas dizem, por exemplo, que não conseguem viver sem doce. Novamente, isso é só um hábito. Porém, é um erro tirar dos hábitos um sentido de “eu”, pois os hábitos não são a pessoa, não são o “eu”. O verdadeiro eu não é encontrado em coisas externas, mas as pessoas acabam se identificando e achando que são essas coisas.

Por causa da identificação, remover hábitos negativos e substituí-los por positivos acaba se tornando muito difícil, ainda mais levando em conta a forma como são construídos. Muitos deles foram formados há muitas gerações e transmitidos cultural e socialmente, por isso raramente são notados e contestados. Existem por exemplo as touradas, que são apreciadas pela maioria das pessoas de determinado país ao mesmo tempo em que para uma minoria naquela mesma cultura e para pessoas de outros países, como o nosso, é uma coisa horrenda. Mas é uma tradição muito antiga naquele local, por isso a maioria das pessoas não pensa a respeito. E o mesmo acontece em todos os países e culturas, INCLUSIVE O NOSSO (não podemos nos esquecer de que também temos erros, e como disse Jesus Cristo, não podemos desejar remover o cisco no olho do irmão quando nem mesmo percebemos a trave que se encontra em nosso próprio olho).

Grupos são formados em torno de interesses em comum, por isso surgem conversas e costumes que de uma forma geral são comuns a todas as pessoas do grupo, Mas ao mesmo tempo, uma pessoa pode pertencer a vários grupos, e assim possuir hábitos de acordo com cada grupo, deixando de lado os hábitos de um grupo quando está com outro. É por isso que o grupo de amigos da faculdade é diferente do grupo do trabalho, da escola ou dos amigos de infância. Dentro de um grupo as pessoas gostam aproximadamente das mesmas coisas, vão aos mesmos lugares e conversam sobre as mesmas coisas, e como naturalmente existem algumas diferenças de interesse entre as pessoas, dentro de um grupo são formados subgrupos.

Veja que trabalhamos com pessoas que realizam o mesmo tipo de trabalho, por isso ali existe um grupo, onde surgem assuntos que são comuns ao trabalho porque as pessoas fazem as mesmas coisas. Da mesma forma, este pode ser um subgrupo, pois onde trabalhamos existem pessoas que realizam outras funções que não a nossa. Assim o grupo é formado por pessoas que realizam funções diferentes, mas com objetivos em comum. Com essas pessoas a relação é diferente, pois os hábitos em comum são outros.

Da mesma forma, na faculdade as pessoas se agrupam em torno de um mesmo curso, portanto ali há um grupo formado, e outros grupos se formam de acordo com o ano de ingresso e também pela afinidade das pessoas entre si. Na família as pessoas conversam sobre as mesmas coisas, comem as mesmas coisas, falam das mesmas coisas. No grupo de amigos os temas dos assuntos são aproximadamente os mesmos, da mesma forma que os lugares freqüentados, as mesmas expressões são usadas, isso dá uma identidade, uma característica ao grupo.

Infelizmente, por causa da consciência comum (este é um termo que Eckhart Tolle utiliza no livro “O poder do Agora” para se referir ao nível de consciência que se encontra a maioria das pessoas) a mente da maioria das pessoas está presa ao passado, e por isso elas não acreditam muito em mudanças. Acontece que se você está mudando, inconscientemente elas não aceitam muito bem a mudança porque são apegadas a quem você era no passado e está tentando deixar de ser.

É por esses motivos que hábitos coletivos, ou seja, hábitos culturais e sociais são mais difíceis de serem removidos do que aqueles criados individualmente. Se os grupos possuem hábitos coletivos, as pessoas estão acostumadas a se relacionar com você de uma maneira determinada. É aí que se encontra a maior dificuldade na mudança, pois as pessoas mais próximas são justamente as que mais dificultam.

Quando você procura mudar e deixa de conversar sobre coisas que considera ou percebe serem negativas, ou muda qualquer tipo de costume, você acaba encontrando resistência por parte de muitas pessoas nos seus grupos, porque o ego delas acredita que você tem que permanecer o mesmo. Acredito que isso aconteça principalmente por dois motivos. Primeiro porque dessa forma as pessoas não precisam se esforçar para tratá-lo de forma diferente. Segundo porque com a sua mudança elas sentem uma ameaça à identidade do grupo e à identidade delas. Mas apesar de inconscientemente desejarem que você não mude, elas mesmas não repararam em como elas mesmas e o próprio grupo mudaram após alguns anos. Pense em um grupo de amigos e veja quantas coisas o grupo já deixou para trás.

Muitas vezes as pessoas demoram para entender, aceitar e respeitar as mudanças que ocorre em você, por isso elas lhe trazem as mesmas coisas que você quer deixar para trás e isso acaba te atrapalhando. Não é que as pessoas te atrapalham, mas sim que você se atrapalha por causa delas, porque elas vem conversar sobre coisas que você não quer mais falar, te convidam para lugares que você não quer mais frequentar e como você ainda está habituado a tudo isso você acaba fazendo de novo as mesmas coisas. Muitas vezes fazemos coisas que não queremos só porque ainda estamos habituados, sendo assim a culpa não é de ninguém além de nós mesmos.

Pela força que o ego se agarra as coisas passadas, acreditando que elas são estáticas e permantes, muito sofrimento é criado, até mesmo porque a energia envolvida para manter as coisas sob controle é muito grande. É como tentar parar as ondas do mar, é uma energia gasta inutilmente pois elas não vão parar. Da mesma forma, o ego não é capaz de manter as coisas iguais por muito tempo. Seja por causa da idade, amadurecimento ou experiências vividas alguma coisa na personalidade acaba mudando. Mesmo que algumas vezes acabamos arrumando alguma desculpa para justificar mudanças que dizíamos que nunca aconteceriam, invariavelmente elas acontecem.

Assim como dedicamos horas de estudo, por exemplo, para adquirir algum conhecimento na universidade, ou para atingir um objetivo, devemos igualmente investir tempo todos os dias para a mudança de nossos hábitos, seja lá qual for a forma que encontremos para se fazer isto. E também é normal que as pessoas que procuram uma transformação real e profunda acabem encontrando resistência, principalmente se tentarem mudar sem se desfazer do grupo que pertencem, até mesmo porque isso não é sempre necessário. Para estas pessoas, certamente é necessário abrir mão de algum tempo que era dedicado aos outros para que possam dedicar-se a si mesmas. Pode demorar até que as pessoas compreendam, e talvez isso nunca aconteça, mas não devemos nos preocupar muito com as dificuldades porque no momento certo as coisas se ajeitam. O importante é que sejamos sinceros, persistentes e fortes nas mudanças, pois assim encontraremos o nosso ser real e imutável, portanto, não desista de tentar mudar.

Por fim, indico a leitura ou releitura dos posts aquele que muda e saindo da zona de conforto para complementar este assunto.

FYM

Jerônimo Martins Marana

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